Enquanto as pessoas discutiam a repercussão dos discursos proferidos na Assembléia Geral da ONU, em Nova Iorque, na última semana, fiquei analisando as posturas dos principais líderes mundiais diante da questão palestina. Mas o que realmente me chamou a atenção foi o discurso do americano Barack Obama, no qual ele exaltou a relação dos Estados Unidos da América com Israel, sublinhou com caneta vermelha o entendimento de que os judeus são as vítimas da humanidade, isso em pleno século 21, e sequer se referiu aos palestinos como um povo, mas sim como indivíduos que atrapalham e incomodam a paz de sua queridinha Israel. Para piorar ainda mais a situação, declarou clara e definitivamente a oposição americana à inclusão da Palestina como estado membro das Nações Unidas.
Na minha visão, Obama equivale-se a Hitler ao negar a existência e os direitos dos palestinos ao seu próprio Estado, a inclusão deste como membro da ONU e ao negar os direitos fundamentais de um povo injustiçado, oprimido e marginalizado por conta de uma resolução da própria ONU. E mais: Que sistema é este onde um único país tem o direito de vetar a vontade da ampla maioria das nações do mundo?
A Presidenta Dilma tem absoluta razão ao defender, com veemência, a reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas e a inclusão dos países emergentes neste Conselho, de forma a assegurar sua representatividade na chamada nova ordem mundial. Acrescento à este proposta a necessidade de extinção do poder de veto sobre as resoluções que tratam da paz e da segurança mundiais. Não posso conceber que a vontade de um único país possa predominar ou se sobrepor à vontade da ampla maioria dos países do mundo.
Quanto à legítima reivindicação apresentada pelo Presidente da Autoridade Nacional Palestina, creio que esta deveria ter sido aprovada em 1947, quando a Assembléia Geral da ONU aprovou a divisão da Palestina e a criação de Israel. Vale lembrar que naquela ocasião, conforme prevê a resolução, 51% dos territórios pertenceriam à Israel e 49% aos palestinos, porém logo na primeira invasão israelense aos territórios palestinos, os judeus tomaram 78% das terras, contrariando a resolução da própria ONU que criou este estado através de um artifício liderado pelos Estados Unidos da América. Ou seja, além de Israel ser o único estado do mundo criado por uma resolução da ONU, este mesmo estado contrariou a resolução de seu próprio órgão criador, avançando sobre os territórios que caberiam aos palestinos de direito, conforme o entendimento da duvidosa ONU, e cometeu crimes contra a humanidade desde então, com o aval americano, aquele mesmo país que se diz defensor da paz e da segurança mundiais. Este mesmo país que veta agora a inclusão da Palestina como estado membro das Nações Unidas, contradizendo tudo o que prega em seus discursos sobre política internacional.
E para que a situação se torne mais risível ainda, o ex-Primeiro Ministro de Israel, Ehud Olmert, publicou um editorial no conceituado The New York Times, no qual ele repetiu o mantra para lá de gasto e repetido exaustivamente sobre o ideal de dois estados, a retirada "parcial" de alguns assentamentos israelenses construídos em território palestino e a divisão de Jerusalém, de forma que os "árabes" fiquem com a parte "árabe" da capital. Parece um discurso bonito, mas vamos esquartejar este discurso para entender onde se esconde o veneno judeu nele. A retirada parcial dos assentamentos, significa em claro e bom português que os judeus vão ficar com as melhores terras e as mais férteis, onde a água é abundante e onde a infraestrutura é impecável e vão devolver aos palestinos os territórios estéreis em termos de fertilidade do solo e de existência de água potável. A devolução da parte árabe de Jerusalém representa menos de 40% da parte oriental de Jerusalém à qual os palestinos tem direito, porque a maior área de Jerusalém Oriental já foi invadida e tomada por Israel em constantes derrubadas de casas dos palestinos e a expulsão destes para outras localidades da Cisjordânia, ou o que sobrou dela.
Ao proferir seu discurso na Assembléia Geral, Benyamin Netaniahu foi, no mínimo, inescrupuloso, ao dizer que estende a mão às negociações com os palestinos, quando todos nós sabemos que seu governo foi o governo israelense que mais sabotou estas mesmas negociações, paralisadas à quase tres anos dado à indignação palestina e aos últimos ataques israelenses à Gaza, iniciadas no final de 2009, nas quais o exército israelense usou armas químicas, como o fósforo branco, para atacar escolas e hospitais, dizimando centenas de crianças palestinas num único dia.
Por outro lado, minhas esperanças, apesar do quadro negativo, se renovam com as transformações do cenário político no Oriente Médio. Não vamos esquecer que o Governo de Transição do Egito se nega a respeitar o acordo de paz com Israel, as relações com a Jordânia estão estremecidas e porque não classifica-las como caóticas, apesar da tímida negativa de ambas as partes e o principal aliado de Israel na região, a Turquia, encontra-se irredutível em sua exigência de retratação de Israel sobre o ataque à Flotilha da Liberdade em julho de 2010, quando cidadãos turcos das forças de paz que levavam ajuda humanitária à Gaza foram brutalmente assassinados pelas forças israelenses, num ataque realizado em águas internacionais.
O isolamento de Israel na região é fato. É assim que se trata um câncer, este corpo estranho que força sua presença num organismo que não é seu.
Não posso deixar de comentar, ainda, a reação dos judeus palestinos, que se juntaram às fileiras de manifestantes pró Estado da Palestina na Cisjordânia e que mais uma vez manifestaram seu repúdio ao estado sionista artificial de Israel que lhes foi empurrado goela abaixo e com o qual eles nunca concordaram. Todos os palestinos, judeus, cristãos e muçulmanos, uniram-se ontem, num grito único, conclamando o mundo a reconhecer seu direito à um estado palestino independente, soberano e economicamente viável. Só estamos repetindo um grito que ecoa pelo mundo à mais de 62 anos. Será que o mundo vai nos ouvir desta vez?