Hoje eu fiz biscoitos de tâmaras. Uma receitinha palestina antiga que me foi ensinada pela minha avó Miriam. Enquanto preparava a massa, o cheirinho que subia me levou de volta à casa da minha avó em Rosário do Sul, no Rio Grande do Sul.
Minha avó tinha, nos fundos da casa, um forno feito de barro e casca de arroz. Ela assava o pão, os biscoitos, as esfihas, os manakish, tudo naquele forno. Tudo tinha um sabor e um aroma especial. Lembro-me bem da primeira vez em que ela tentou me ensinar a fazer os biscoitos. Ela brigava comigo o tempo todo, por eu ser tão desligada e por não ser uma moça prendada aos dezesseis anos. Dizia que eu nunca conseguiria um bom marido, se eu não aprendesse a cozinhar.
Eu continuei sendo esta pessoa desligada por muitos e muitos anos, mas o que despertou em mim a vontade de aprender a cozinhar não foi a vontade de arrumar um bom marido e sim a vontade de trazer de volta para o meu cotidiano os sabores e os aromas da minha família.
Queria rebuscar aquele calor humano, quando já estava morando sozinha em Brasília, numa Kitinete na Asa Norte e tendo em volta apenas comidas de self-service. Era tudo muito comum e sem aquele aconchego do cheirinho da casa da gente. Resolvi então botar as mãos na massa, literalmente falando. Por sorte, minha mãe veio me visitar e mesmo com a saúde bastante debilitada, não poupou esforços para me ensinar o que eu teimei em não aprender durante muitos e muitos anos.
Foram duas semanas de imersão na culinária palestina. Aprendi de tudo um pouco e fui aperfeiçoando com o tempo. Minha mãe ficou muito orgulhosa do meu esforço e saiu por aí contando a novidade. Ninguém acreditou, pois todos os que me conheciam, sabiam que eu tinha uma verdadeira hojeriza à cozinha, ao casamento e à procriação. Achava toda esta história de casamento um absurdo pelo qual eu não merecia passar.
Mas aquela experiência foi importante, talvez essencial na minha vida. Tive um convívio bastante intenso com a D. Âmina, pela primeira vez na minha vida, e me arrependo de não ter curtido mais esta pessoa maravilhosa que sempre zelou por mim, mesmo quando fui muito ingrata com ela.
Hoje, faço questão de bancar a mamãe chata, que insiste em ensinar as mesmas receitas para as senhoritas Lara e Laura, pois sei que um dia elas lembrarão destes momentos com a mesma saudade que eu lembro agora da minha mãe, da minha avó, da minha casa e do calor da minha família.
Talvez elas levem consigo este mesmo sentimento bom, talvez não. Quem sabe! O importante é levar o legado de uma história bonita e importante, onde nossas raízes continuam vivas e onde nossa existência se traduz nas pequenas coisas do nosso cotidiano, como ensinar nossos filhos a fazerem um trivial biscoito de tâmaras com gergelim, dando boas risadas e sentindo aquele aroma que aquece nossos corações.
Fica minha saudade da D. Âmina e da D. Miriam.
O tempo é um grande professor não é mesmo?
ResponderExcluirTenho certeza absoluta que a tia valorizou cada momento que passou contigo e se orgulha muito, até hoje, de cada coisinha que tu aprendeu com ela, mesmo que tu tenha demorado um tempo para apreender o significado das coisas...e eu também quero aprender a fazer "caki" com a minha MÃE!!
Grande beijo prima!
Amira
PS: não sei não...mas não tenho boas lembranças do forno da citi...perdi um dente comendo o pão árabe dela!!!ehehehe
É prima, mas sempre fica a sensação de que eu poderia ter feito mais pela minha mãe e pela nossa siti.
ResponderExcluirEu também quebrei um pedaço do meu dente uma vez, mas quem manda não esperar o pão esfriar...rsrs
Bjs