Minha filha Laura tem enxaquecas homéricas e toma doses cavalares de antiinflamatórios para superar as crises. Quando a enxaqueca chega à um grau muito elevado, só mesmo internação e remédio na veia. É duro, quando se trata de uma criancinha de nove anos de idade.
Depois de algumas conversas com médicos e amigos, descobri que existe um programa no Hospital de Base de Brasília chamado "Dor de Cabeça". Por sorte, encontrei uma neuropediatra que trabalha neste programa, em outro hospital, onde minha filha estava internada mais uma vez. Ela foi extremamente gentil e fez um encaminhamento para o tal programa.
Foi aí que começou minha via sacra. No primeiro dia, fiquei duas horas e meia numa fila interminável, apenas para conseguir uma rubrica de uma atendente mal informada, mas bastante prestativa. Ela faz milagre para atender, sozinha, centenas de pessoas num único guichê, quando existem outros cinco absolutamente vazios. "Pobre criatura", pensei. Isso, sem falar nas tres voltas que fiz nos estacionamentos do hospital, para arranjar uma vaguinha bem apertada para o meu indefeso carro.
A consulta seria daqui à uma semana. Dei sorte. Algumas pessoas me disseram que esperam cinco meses por uma consulta, inclusive pessoas com problemas graves de saúde e que não deveriam esperar nenhum segundo na fila.
Chega o grande dia. Acordei às 05:30 da madrugada para me preparar e preparar a Laurinha para a consulta. Desta fez fui prevenida. Cheguei bem mais cedo e consegui uma vaga à uns quinze minutos de caminhada do hospital. Laurinha chegou exausta e a enxaqueca começou a ameaça-la com sua chegada. Mas tudo bem, tinhamos uma consulta para daqui à meia hora. Chego à um guichê e converso com uma atendente gorda, mal humorada, monossilábica e imbecil. A aberração me informa que as consultas são por ordem de chegada e não com horário marcado, conforme haviam me informado no guichê da semana passada. Fiquei surpresa, mas informei que minha filha estava tendo uma crise de enxaqueca e precisava ser atendida. Tentei, em vão, argumentar. Ele me mostrou algumas dezenas de crianças que estavam tão necessitadas ou mais ainda que a minha filha. Tive que sucumbir ao argumento. Era a mais pura verdade.
Daí em diante, foram algumas horas de longa espera, em bancos de madeira estreitos e nada condizentes com as condições de quem os usa. Mães de cidades do entorno iam chegando cansadas da viagem, com dois ou tres filhos a tiracolo, sacolas com relatórios médicos, biscoitos e água. Ah, nem água tem no hospital, muito menos papel higiênico nos banheiros. Pedir informação...ah isso é luxo, ou frescura.
Me voltou à mente a imagem do ex-governador Arruda recebendo um bolo de dinheiro. Imaginem se aqueles R$ 50.000,00 fossem gastos para comprar água, papel higiênico e bancos confortáveis para um hospital? Parece pouco, mas seria a garantia de um pouquinho de conforto para os pobres doentes que lá estavam.
É claro que minha filha não foi atendida, já que se aproximava do meio dia, a enxaqueca já tinha piorado muito, ela chorava copiosamente e eu chutei o balde. Eu tenho a opção de chutar o balde, mas e quem não tem esta opção? Como fica o brasileiro que precisa do hospital público com certa frequência? O que será que aconteceu com aquelas crianças que ficaram ali o dia todo esperando por uma consulta? Onde estão os médicos que o governo disse que contratou?
Infelizmente, não existem médicos em número suficiente para atender os doentes, não existem condições de trabalho, não existe material de trabalho, não existem acomodações adequadas, não existe um quadro de funcionários capacitado e, o pior de tudo, não existe nenhuma vontade de mudança. Todas as pessoas que estavam ali, sofriam caladas. Sabiam que estavam tendo seus direitos usurpados e mesmo assim ninguém levantou a voz para reclamar. Nem eu! Não havia ninguém com quem se pudesse reclamar, exceto a aberração gorda que não entendia nadinha do que eu dizia.
Alguém disse: benvinda à realidade brasileira! Mas, pelo que me consta, nós é que transformamos nossa realidade. Então por que ninguém fala nada? Por que as pessoas sofrem caladas, quando podem se unir e exigir um atendimento digno de um ser humano? É o mínimo, já que passamos quatro meses do ano pagando impostos altíssimos para o governo. Está na hora de pedir um retorno digno. Pensem nisso na hora de votar nos próximos candidatos e lembrem-se de que a anulação de votos obriga os partidos a apresentarem novos candidatos. Só assim as coisas mudam.
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