Ela era uma moça magrela e tímida. Meio sem graça até. Das cinco irmãs, era a mais calada. Duas das irmãs eram risonhas e contadoras de "causos", atraíndo todas as atenções. Uma chamava a atenção pela beleza, brancura da pele e pela altivez. A quarta irmã era séria, decidida e tomava a frente de tudo.
Já Ghalieh era obediente, falava baixinho e escondia o rosto quando tinha vontade de rir. Casou-se aos quinze anos de idade, com um homem bem mais velho, viúvo e que já tinha uma filha de dois anos. Halima.
Ghalieh não queria se casar com aquele homem, pois ele a assustava, porém aceitou a proposta porque seu pai o achou conveniente. Ela não ousava dizer não ao pai, ao contrário de suas irmãs. Quanto à mãe dela, esta era uma tirana. Foi a mãe de Ghalieh que arranjou tudo para consumar este casamento, considerando que a filha já estava passando da idade de casar.
Era a década de 40, num vilarejo do interior da Palestina. Uma menina de 15 anos já deveria estar casada e como Mahmud foi o único pretendente até então, não havia outra saída senão casar-se com ele.
Ghalieh não era uma moça linda, mas também nunca foi feia. Ela tinha a pele branquinha, cabelo preto cacheado, olhos castanhos bastante expressivos, uma boca bonita e delicada, narizinho empinado, mas era magra. Naquela época, magreza era considerada fraqueza e fraqueza significava incapacidade para gerar filhos. Portanto, havia uma possibilidade de Ghalieh não gerar filhos.
Mas como Mahmud já tinha uma filha e precisava de uma mulher para cuidar dela, não pensou duas vezes em pedir a mão de Ghalieh em casamento, mesmo tendo este "defeito".
A menina magrela surpreendeu a todos, fincando grávida logo no primeiro mês de casamento. E qual não foi seu orgulho, quando nasceu o seu primogênito. Um filho! Sim, um homem! Fawzi. O primeiro neto!
Ora, ora, não é que a magrela escondia o jogo! O marido não dava à ela a devida atenção nos primeiros meses de casamento, mas quando o seu herdeiro nasceu, aquele que levaria seu nome, Ghalieh passou a gozar de privilégios antes impensáveis. Até as irmãs que dela desdenhavam, passaram a trata-la com mais respeito.
Um ano depois, ela deu a luz à uma menina e depois outra e mais outra. Tres meninas. Novamente seu horizonte escureceu, pois dar a luz à tantas meninas numa época em que se engrandeciam mulheres que pariam machos, era o fim. E parecia o fim mesmo. Seu marido até a deixou com os filhos e foi trabalhar para o exército inglês como alfaiate. Nesta época, a Palestina era uma colônia inglesa.
Ghalieh ficou muito triste. O desdém das irmãs recomeçou, pois elas já tinham se casado e tido alguns filhos homens. Mas apesar daquele jeitinho frágil, Ghalieh era uma mulher persistente. Continuava a trabalhar no campo, a criar seus filhos, a tecer suas hasires (esteiras) e a bordar seus vestidos. Logo que seu marido voltou para casa, ela engravidou novamente. Desta vez foi um homem. Depois vieram mais tres varões.
Quem diria? Aquela magricela gerou uma prole e tanto! Seu último filho nasceu em 1965, quando eles já moravam em Ramallah. Dois anos depois, a família fugiu da guerra, mudando-se para Jericó e depois para Amman na Jordânia.
Ghalieh foi a matriarca magricela e tímida da família Arar. Uma magricela forte que manteve a família unida e seus filhos vivos, apesar das guerras. Ela aprendeu a sorrir, a falar, a contar causos, a cantar e dançar nos casamentos. Ela tinha uma memória excepcional e conhecia poesias antigas como ninguém. Além de ser a dançarina mais animada dos casamentos.
Ghalieh é minha avó paterna. Foi com ela que aprendi a gostar de poesia, de música palestina, de cozinhar e de bordar.
Saudades ya seti!
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