Sempre que falo sobre costumes palestinos, acabo debandando para o lado da comida. Parece que os palestinos só pensam em comida, né?
Não posso dizer que "só" pensam em comida, mas que ela ocupa boa parte do tempo dos palestinos, isto é inegável. Mas não é por gula. O sentido da comida para os palestinos é bem outro. Tem à ver com o sentido da família, da união, da confraternização, do calor humano, de momentos deliciosos ao lado das pessoas que amamos.
Tanto na minha família, quanto em todas as famílias que conheço, o ritual é o mesmo desde sempre. Os integrantes da família começam a planejar a refeição principal do dia desde cedo. Logo no café da manhã, cada um começa à dizer o que está com vontade de comer. Aí começam as discussões, disputas e brigas, obvio, sobre o prato principal.
Eu tenho um tio que era o mimado da família e ele sempre impunha as vontades dele aos outros. Até que ele tinha bom gosto, mas às vezes insistia em comer mlukhieh duas vezes por semana. Uma vez até que vai e é uma delícia, mas mlukhieh é como uma feijoada, não dá pra ficar repetindo. Enjoa!
Nas casas palestinas, alguns pratos são meio obrigatórios, tipo a makloube, que é uma galinhada feita com beringela ou couve flor ou batata, depende da estação. Depois da makloube e da mlukhieh, vem o kafta, o dawali (charutinhos de folha de uva), o malfuf (charutos de repolho), a abobrinha e a beringela recheadas, a mjadara (arroz com lentilhas) e os ensopados de feijão branco, vagem, batata, quiabo, grão de bico e outras verduras da estação. Como a carne é escassa, usam-se pedaços pequenos só para dar aquele gostinho. Duas vezes por ano, fazemos o maftul, que é uma espécie de cuzcuz que vem acompanhado de ensopado de grão de bico e frango cozido. Uma delícia, mas dá um trabalhão danado. Também comemos karshat uma vez por ano, depois do Eid Al Adha (dia do sacrifício), quando abatemos carneiros para distribuir a carne aos pobres. O que se usa para fazer o karshat são as tripas do carneiro, mas não fiquem com nojo, porque elas ficam tres dias de molho no limão e no tempero, depois de muito muito bem lavadas. É bom! Minha mãe recheava com arroz, carne moída, ervas e colocava um temperinho tão gostoso! Show de bola!
Se a família for mais abastada, ela abate um carneiro só para fazer o mansaf. Este prato é feito com pedaços grandes de carne de carneiro cozidos no jamid (leite de cabra petrificado) e depois misturado com arroz e pinhole frita. Perfeito para acabar com a dieta. No dia em que se faz mansaf, os palestinos convidam os parentes, os vizinhos e quem estiver passando pela rua (brincadeirinha)! Mas não tem graça nenhuma, se tiver pouca gente para comer.
E os doces? Estes são um verdadeiro ritual. O mais fácil deles leva cerca de 4 horas para ficar pronto. O que eu mais gosto é o maamul, mas este leva dois dias de trabalho e precisa de muitas mãos. Só para a massa ficar semi-pronta, precisa descansar 12 horas. Depois é misturada novamente, prepara-se um recheio de tâmaras e outro de castanhas. As fôrmas são de madeira e para desinformar o maamul, tem que bater bem forte na mesa. Haja braço! Mas o resultado é um docinho dos deuses! Minha boca está ficando cheia d´água!
Enfim, é isso que eu quero dizer: para se fazer uma comida palestina, precisamos mobilizar a família toda. Cada um participa de alguma forma e o resultado é uma família unida em torno de uma mesa farta, bonita, colorida e apetitosa.
Vai ver que os israelenses já perceberam isso e por este motivo privam os palestinos até do alimento, como forma de dispersa-los. Mas não adianta, porque nós temos raízes e elas estão bem fincadas na Palestina. Mesmo tentando nos vencer pelo cansaço, pela fome e pela privação, eles não conseguem vencer nossos corações e nossas almas. Estas são livres, fortes e bem nutridos pelo nosso sangue guerreiro!
Sou uma admiradora do povo palestino e, claro, de suas comidas. Espero que este povo tão sofrido consiga seu estado, sua paz e seja feliz realmente. Gostaria de saber sobre os costumes dos palestinos, seus hábitos, casamentos, etc. Danço a dança do ventre e folclorica arabe e me interesso por este assunto, alem do carinho especial que sinto pelos palestinos.silvaninha.soares@hotmail.com
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