terça-feira, 2 de junho de 2009

HASIREH

Levaria horas e mais horas para contar o ritual palestino de tecer esteiras de palha, mas vou tentar sintetizar o assunto.
Minhas avós me contaram que na Palestina existe um tipo de palha bastante resistente, ou pelo menos exisitia, que era usada para fabricar esteiras, bandejas, cestas e outros apetrechos. Vou me ater às esteiras, conhecidas como "hasireh". Minhas avós colhiam a palha, deixavam-na de molho por algumas horas, algumas com tintura colorida, outras in natura. Secavam-na e teciam lindas esteiras para cobrir o chão das casas. As "hasires" são uma verdadeira demonstração da arte palestina. Nunca existirão duas iguais. Os desenhos eram improvisados na hora, numa mistura deslumbrante de cores.
Fora o uso da "hasireh" como tapete, eram usadas também como uma espécie de toalha para refeições. Até pouco tempo atrás, o ritual de estender a "hasireh" era obrigatório e até dava um certo status às familias.
Minha memória viaja agora para a Jordânia, para a casa dos meus avós, para a hora do café da manhã. Lá estava minha avó assando o pão no forno de barro, minha tia cortando o queijo que vinha em latões de Nablus "Jibneh Nabelsieh", minha outra tia servindo azeitonas, azeite e zaatar da Palestina, minha mãe cortando verduras para a salada, meu avô Mahmud vindo da rua carregando os pratos de Homos, Ful e Falafel, meus tios, ainda adolescentes, brigando para guardar as roupas de cama, enfim, toda aquela muvuca de família grande.
Nos sentávamos em colchões no chão, em volta da "hasireh" repleta de coisas deliciosas, cheirosas, apetitosas. Era um ritual único, alegre, descontraído e cheio de calor humano. Meu avô contava histórias engraçadas, meus tios contavam piadas, minha avó falava baixinho tentando manter a ordem, minha mãe toda tímida diante da família do marido, meu pai com cara de galã dos anos sessenta contando vantagens.
Este era o espírito de quem comia numa "hasireh". Hoje comemos em mesas lindas de madeiras nobres, com pratos de porcelana e talheres de aço inoxidável, com um paladar sintético e uma solidão assustadora. Prefiro a "hasireh", o azeite com zaatar, o queijo de Nablus e a alegria de um lar verdadeiro.

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